Nossas relações
interpessoais se desenvolvem algumas vezes de maneira despercebida, com a
utilização diuturna de inúmeros contratos de natureza civil, consumerista,
comercial, financeira, dentre tantas outras, a começar pela compra e venda do
pão matinal para o café da manhã (contrato informal verbal) até o financiamento
imobiliário para a aquisição da casa própria (contrato formal escrito).
Nesse contexto multifacetado, quando as pessoas naturais ou
jurídicas de direito público ou privado contratam, assim o fazem em momento de
absoluto consenso, harmonia e convergência de objetivos, com a esperança
(algumas vezes vã) de que o parceiro haverá de bem e fielmente adimplir as
obrigações por ambos assentidas e delineadas nas respectivas cláusulas
contratuais.
Portanto, a
expectativa inicial dos contratantes é no sentido de que o pacto estabelecido
por mútuo consenso termine em data aprazada e a bom termo, isto é, cumprido em
todo o seu conteúdo e extensão. Todavia, em que pese o inadimplemento não ser
desejado pelas partes, ele não pode ser desconsiderado como hipótese
absolutamente plausível e, consequentemente, previsível.
Assim, a primeira
providência a ser tomada por quem contrata é definir com clareza todos os
termos da avença, quais sejam: sujeitos da relação, objeto, preço, prazo, local
de cumprimento, cláusulas penais (multas), foro competente para o deslinde de
eventual conflito decorrente de descumprimento e de que forma será dirimida a
controvérsia, ou seja, através de jurisdição estatal (Poder Judiciário) ou
jurisdição privada (arbitragem), e, nesta última hipótese, a clausula
compromissória poderá ser cheia (definindo desde logo o árbitro, tribunal ou
instituição arbitral) ou vazia (simplesmente indicando que a conflito será
dirimido através de arbitragem).
Contudo, antes de
buscar a jurisdição (pública ou privada) para a resolução da controvérsia
instaurada, é de bom alvitre que as partes conflitantes, tentem a
autocomposição fazendo uso da mediação. Explica-se: a mediação é técnica não
adversarial de resolução de conflitos, em que o mediador nada decide, nada
julga, nada impõe, não condena ou ordena, pois a ele compete conduzir as partes
a encontrar, por si mesmas, a via de meio que melhor atenda aos seus interesses
– resolução consensual da controvérsia (ganha/ ganha); diferentemente, a
arbitragem é meio adversarial de resolução de conflitos, valendo lembrar que
segundo os próprios termos da Lei 9.307/96, “o árbitro é juiz de fato e de
direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a recurso ou a homologação
pelo Poder Judiciário” (art. 18) e, por conseguinte, a decisão importará sempre
na definição da parte vencedora e vencida (ganha/perde).
Os conflitos de
natureza patrimonial encontram permissivo legal para serem dirimidos em juízo
arbitral, assim como podem ser solucionados perante o Estado-juiz, sendo que essa
definição respeita tão-somente as partes envolvidas. Nesses casos, há de se
perquirir quais são as possíveis “vantagens” e “desvantagens” dessa escolha. De
início, assinala-se que não há a melhor ou pior forma de prestação de tutela
jurisdicional, isto é, pública ou privada, sendo que tudo dependerá da natureza
do conflito apresentado no caso concreto, da complexidade da matéria objeto da
lide, de seu conteúdo patrimonial, o decurso de tempo desejado para a solução
da controvérsia etc. Em outros termos, será a escolha (adequada ou inadequada)
que norteará os resultados mais ou menos vantajosos decorrentes da opção por
determinado tipo de jurisdição (pública ou privada).
Primeiramente, a
arbitragem é mais simples e objetiva, e os julgadores, além de imparciais, são
técnicos especializados na área sobre a qual recai o objeto litigioso e, via de
regra, do mais alto quilate científico e respeitabilidade. Esses atributos
conferem às partes um julgamento seguro e rápido, sobretudo se confrontado com
os atropelos verificados na jurisdição pública.
Em segundo lugar,
a rapidez na prestação da tutela jurisdicional privada perseguida decorre de
dois outros fatores, quais sejam, a irrecorribilidade das decisões arbitrais
(interlocutórias ou sentença arbitral) e inexistência de homologação da
sentença pelo Poder Judiciário.
Em terceiro lugar,
não se deve perder de vista que a arbitragem é via de regra uma jurisdição de
custos elevados, na exata medida em que os árbitros (profissionais de renome em
suas respectivas áreas de atuação profissional) são pagos pelos próprios
litigantes, assim como todas as despesas atinentes ao procedimento arbitral e,
ao final, pelo vencido.
Portanto, a
jurisdição privada não é o foro adequado para demandas patrimoniais de pequeno
ou médio porte.
Em quarto lugar,
como as partes ou os árbitros podem definir o procedimento que será imprimido
ao processo respectivo (dependerá apenas da convenção arbitral), haverá sempre
uma perfeita sintonia entre a tutela pretendida e o instrumento oferecido, o
qual, via de regra, prima pelo princípio da oralidade e, por conseguinte,
atende aos seus outros subprincípios, tais como a imediatidade, concentração,
simplicidade, informalidade, economia e celeridade.
Em quinto, ficam
as partes absolutamente livres para definir se a decisão arbitral será fundada
em eqüidade ou em direito e, neste último caso, quais as regras (nacional ou
estrangeiras) que irão nortear o julgamento dos árbitros.
Em sexto lugar, é
muito vantajosa a possibilidade conferida de escolha dos árbitros, o que se faz
em comum acordo pelas próprias partes, de maneira que a indicação recaia sobre
pessoas previamente definidas e detentoras de profundo conhecimento da matéria
litigiosa ou, ainda, permite que se faça referência à instituição arbitral
especializada que, por sua vez, dispõe de um quadro bem formado de árbitros.
Em sétimo lugar, a
sentença arbitral é proferida sempre em prazo definido previamente pelas partes
e, nada sendo convencionado, em até seis meses a contar da data da instituição
da arbitragem ou da substituição do árbitro.
Por último, a
discrição e o sigilo dos atos processuais e do julgamento propriamente dito
importam em outra vantagem, à medida que as partes permanecem comodamente
durante todo o processo e, em especial, para a produção de provas, o que não
raras vezes viabiliza a consecução de um acordo. Aliás, a jurisdição arbitral é
foro também adequado à composição amigável ou para a convergência dos esforços
dos litigantes no sentido de alcançarem rapidamente – sem descurar dos valores
maiores que são a segurança e a justiça da decisão – à resolução final da lide,
tendo em vista que, na maioria das vezes, ambos têm interesse na solução do
conflito que, comumente, envolve quantias vultosas de dinheiro, com inúmeros
efeitos diretos e reflexos.
**Artigo publicado em coautoria com o doutor Jurandir Sell Macedo na Revista RI - Relações com Investidores, n. 128, Fev/2018, p. 49-51.